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Alberto Carvalho — Narrador para quem ainda escuta as palavras

O espaço de Alberto Carvalho, crónicas, contos e reflexões para quem lê devagar

O peso das palavras no mercado

O dia em que a banca de flores se riu de mim


A culpa foi minha.


Entrei na praça com aquele ar distraído de quem só vai “dar uma volta” e acabei com um ramo de gerberas debaixo do braço, duas histórias na mala e uma gargalhada no ouvido.


A banca de flores fica logo à direita, perto da entrada.


A senhora que a toma conta — cabelos brancos como as margaridas do fundo — conhece todos pelo nome e pelo tipo de vaso que levam.


Eu, que não compro flores todos os dias, cheguei a sorrir e a dizer que só estava a ver.


A ver é como quem diz…”, respondeu ela, com aquele tom de quem já sabe que vai vender.


Enquanto me mostrava as gerberas, foi-me contando que na véspera uma cliente se queixou que as rosas duraram pouco.


“Mas olhe que não foi por minha causa… foi porque o marido chegou antes da hora de chegar”, disse ela, piscando o olho.


A senhora da banca ao lado, que vende queijos, soltou uma gargalhada tão sonora que três pessoas pararam para ver o que era.


No meio disto, apareceu um miúdo, uns dez anos, com uma nota amarrotada na mão.


Veio comprar uma flor para a professora porque “ela gosta mais de flores do que de chocolates”.


A senhora encheu-lhe a mão de cravos e disse: “Diz que é oferta da casa… mas se ela perguntar, tu dizes que foste tu que escolheste”.


O miúdo saiu dali com ar de herói.


Fiquei a pensar que é assim que se fazem as praças: uma banca de flores que se ri, uma de queijos que não perde uma boa piada, e um rapaz que vai fazer o dia de alguém mais bonito.


Saí dali com o ramo de gerberas e a certeza de que, mesmo quando não precisamos de nada, há sempre qualquer coisa na praça que precisa de nós.


Maria do Rio

Praças de Portugal


Retrato da Maria do Rio, cronista de rua que conta histórias dos mercados portugueses
Maria do Rio - — Cronista de rua nas praças portuguesas

5 comentários

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Maria Mota
16 de ago.
Avaliado com 5 de 5 estrelas.

Parabéns, mais uma vez, para todos.

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Maria Mota
16 de ago.
Avaliado com 5 de 5 estrelas.

Já li alguns textos! Estou também a tentar encontrar a forma mais rápida de aqui chegar. Parabéns aos que escrevem.

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Convidado:
11 de ago.
Avaliado com 5 de 5 estrelas.

Gostei!

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Maria Mota
16 de ago.
Respondendo a

Olá boa tarde! Tive que colocar outro e mail. Não sei bem o que se passou! Voltei a conseguir entrar nos textos. Obrigada Alberto Carvalho e aos restantes autores dos textos. Abraço amigo.


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