O peso das palavras no mercado
- Maria do Rio - Narradora

- 10 de ago.
- 2 min de leitura
O dia em que a banca de flores se riu de mim
A culpa foi minha.
Entrei na praça com aquele ar distraído de quem só vai “dar uma volta” e acabei com um ramo de gerberas debaixo do braço, duas histórias na mala e uma gargalhada no ouvido.
A banca de flores fica logo à direita, perto da entrada.
A senhora que a toma conta — cabelos brancos como as margaridas do fundo — conhece todos pelo nome e pelo tipo de vaso que levam.
Eu, que não compro flores todos os dias, cheguei a sorrir e a dizer que só estava a ver.
“A ver é como quem diz…”, respondeu ela, com aquele tom de quem já sabe que vai vender.
Enquanto me mostrava as gerberas, foi-me contando que na véspera uma cliente se queixou que as rosas duraram pouco.
“Mas olhe que não foi por minha causa… foi porque o marido chegou antes da hora de chegar”, disse ela, piscando o olho.
A senhora da banca ao lado, que vende queijos, soltou uma gargalhada tão sonora que três pessoas pararam para ver o que era.
No meio disto, apareceu um miúdo, uns dez anos, com uma nota amarrotada na mão.
Veio comprar uma flor para a professora porque “ela gosta mais de flores do que de chocolates”.
A senhora encheu-lhe a mão de cravos e disse: “Diz que é oferta da casa… mas se ela perguntar, tu dizes que foste tu que escolheste”.
O miúdo saiu dali com ar de herói.
Fiquei a pensar que é assim que se fazem as praças: uma banca de flores que se ri, uma de queijos que não perde uma boa piada, e um rapaz que vai fazer o dia de alguém mais bonito.
Saí dali com o ramo de gerberas e a certeza de que, mesmo quando não precisamos de nada, há sempre qualquer coisa na praça que precisa de nós.
Maria do Rio
Praças de Portugal
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Parabéns, mais uma vez, para todos.
Já li alguns textos! Estou também a tentar encontrar a forma mais rápida de aqui chegar. Parabéns aos que escrevem.
Gostei!