Assad vive exílio de luxo entre Moscovo e Dubai
- Helena Vale

- há 22 horas
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NOTÍCIA · Mundo · Rússia/Síria
Poucas semanas depois de a ofensiva rebelde ter derrubado o regime em Damasco, um sírio emigrado em Moscovo entrou num restaurante de topo, no alto de um dos arranha-céus mais emblemáticos da capital russa.
O ambiente era o esperado: recepção cuidada, cocktails caros, clientela com “credenciais”.
A instrução para não fotografar também não surpreendeu.
O que o deixou sem palavras foi outra coisa: numa mesa próxima, estaria Bashar al-Assad, o antigo presidente sírio deposto.
O episódio é um detalhe — mas ajuda a compor um quadro maior.
Durante décadas, o apelido Assad foi associado, dentro e fora da Síria, a um poder fechado e violento.
Hoje, o núcleo do antigo regime vive fora do país, com a Rússia como principal porto de abrigo político e logístico. O que era opaco no exercício do poder permanece opaco no exílio; ainda assim, começaram a surgir fragmentos que permitem perceber o padrão: conforto, protecção, discrição e uma sensação de impunidade.
Segundo relatos de pessoas próximas da família e de antigos elementos do aparelho de segurança, a fuga para Moscovo terá sido organizada com rapidez e meios próprios, recorrendo a deslocações privadas e a um circuito controlado.
Nos primeiros dias, a família terá sido alojada em apartamentos de luxo geridos por uma unidade hoteleira premium — um tipo de solução temporária que combina privacidade com serviços de alto nível.
A partir daí, terão passado para uma residência mais estável num dos complexos residenciais mais exclusivos da cidade, no mesmo edifício que alberga o restaurante onde Assad foi visto.
Mais tarde, as referências convergem num novo destino: uma zona residencial seleta nos arredores a oeste de Moscovo, conhecida por concentrar figuras da elite russa e por oferecer condições de segurança e isolamento difíceis de replicar no centro urbano. Em paralelo, surgem descrições de movimentos acompanhados e vigiados, com uma regra central: silêncio.
O objetivo, segundo essas fontes, seria evitar declarações públicas e reduzir ao mínimo o “rasto” político e mediático.
A mesma lógica aplica-se a Maher al-Assad, irmão do ex-presidente e figura-chave do antigo aparelho militar.
Há quem o descreva a circular com discrição, por vezes disfarçado, associado a edifícios de alto padrão no distrito financeiro e a locais de lazer frequentados por círculos endinheirados. Não se trata de prova judicial, mas de um conjunto de observações repetidas, reforçadas por sinais digitais e por relatos cruzados.
Também a geração mais nova da família tem deixado marcas — ainda que cuidadosamente controladas. Há referências a celebrações privadas com custos elevados, realizadas fora da Rússia, e a sinais de consumo de luxo detectáveis em publicações de pessoas do círculo social. Vários perfis aparecem protegidos, com nomes pouco óbvios; o que foi possível inferir, segundo quem acompanhou esses sinais, resulta de redes de contactos e de imagens indirectas publicadas por terceiros.
A presença da família no Golfo, por seu lado, surge ligada a um entendimento informal que permitiria estadias e circulação com menos exposição. É neste contexto que aparece um dado politicamente sensível: uma das filhas terá retomado estudos numa universidade internacional, com proteção visível.
A reação de colegas e um episódio envolvendo um grupo de mensagens — alegadamente encerrado após tensão política — ilustram como o peso do apelido pode atravessar fronteiras, criando fricção mesmo longe do país que o regime deixou para trás.
No plano interno da “corte” em exílio, há sinais de uma diferença de estilos. Alguns relatos indicam que Maher terá apoiado financeiramente antigos aliados, ajudando-os a recomeçar.
Já sobre Bashar al-Assad, circula uma narrativa inversa: a de um círculo de serviço abandonado, com um caso emblemático de um assistente pessoal que teria ficado sem meios e sem cobertura quando a família consolidou a sua instalação. A história, verdadeira nos seus factos essenciais ou não, é politicamente coerente com um padrão de poder: proximidade enquanto útil; descartabilidade quando o sistema cai.
O que estas peças sugerem — sem fechar o quadro — é que o exílio da família Assad não é o retrato de uma fuga desorganizada nem de uma queda acompanhada por privação. Pelo contrário: aponta para uma transição assistida, com proteção estatal russa, condições materiais elevadas e uma disciplina de comunicação destinada a evitar danos adicionais e a limitar responsabilizações futuras.
Para os sírios, a imagem é especialmente corrosiva: um país devastado e empobrecido fica para trás; os responsáveis máximos, ao que tudo indica, reconstroem a vida em corredores de luxo, longe de qualquer tribunal e fora do alcance do sofrimento que ajudaram a produzir.
Helena Vale · The Library


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