O Juiz que Fez da Justiça um Altar
- Frei Lourenço de Santa Clara - Narrador

- 1 de set.
- 3 min de leitura
Pequeno Tratado do Invisível — Frei Lourenço de Santa Clara
O sino que bate quando alguém parte não soa apenas no adro da sua igreja, ecoa também no coração de todos os que, sem se conhecerem, reconhecem nele a bondade.
Hoje, esse sino dobra por Frank Caprio.
Não foi um sacerdote, nem um pregador, mas soube exercer a sua magistratura como quem entende que a justiça é um altar: deve ser servida com reverência, humildade e compaixão.
Há juízes que se sentam na cátedra como quem segura um bastão.
Outros, como ele, escolhem olhar os que têm diante de si como irmãos, com a paciência que nasce não da lei escrita, mas da consciência desperta.
A sua corte em Providence tornou-se, para o mundo inteiro, uma pequena catedral de humanidade. Não se julgavam apenas transgressões ao código da estrada, julgava-se a fragilidade humana, o peso das circunstâncias, o fardo dos dias. E cada sentença era também uma homilia: breve, clara, carregada de misericórdia.
A televisão, que tantas vezes é instrumento de ruído, converteu-se, com ele, em janela de evangelho laico.
Milhões viram no ecrã não um espetáculo de condenação, mas um rito de reconciliação.
O juiz não perguntava apenas “o que fez?”, perguntava “o que lhe aconteceu?”.
E na resposta, havia sempre espaço para a compreensão, para a lágrima contida, para a mão que não se ergue contra, mas se estende a favor.
Quantos corações endurecidos terão sido tocados ao vê-lo perdoar uma multa a quem não podia pagar?
Quantos jovens terão aprendido que a justiça não é vingança, mas cuidado?
E quantos de nós, assistindo em silêncio às suas audiências, não sentimos que estávamos diante de um evangelho sem capítulo nem versículo, mas tão verdadeiro como qualquer palavra dita no púlpito?
Frank Caprio foi juiz, mas sobretudo foi pastor.
O rebanho que lhe coube não se reuniu em templos, mas nas ruas, nos bairros, nas salas de tribunal. Ele não citava o Direito como quem brandisse uma espada, mas como quem recorda que a lei só cumpre a sua missão quando se inclina diante da dignidade humana.
Hoje, quando celebramos a sua memória, devemos fazê-lo em silêncio agradecido.
Porque o exemplo de um só homem é suficiente para nos lembrar que não há sistemas perfeitos, mas pode haver gestos perfeitos.
Que não há tribunais infalíveis, mas pode haver juízes que escolhem ver primeiro a pessoa e só depois o processo. Que a misericórdia não fragiliza a justiça, antes a eleva.
A sua vida recorda-me uma antiga oração: “Senhor, dá-me olhos para ver a miséria, ouvidos para escutar o clamor, coração para acolher quem sofre.”
Ele viveu essa oração na toga que vestia.
Não a usava como símbolo de poder, mas como véu de serviço. E cada vez que sorria a um acusado, mostrava que a compaixão também pode ser sentença.
Fica-nos agora a tarefa de prolongar a sua obra. Não apenas no sistema judicial, mas na vida comum.
Cada um de nós é chamado, todos os dias, a ser juiz em pequenas coisas: quando decidimos se ouvimos ou se viramos o rosto; quando escolhemos perdoar ou insistir na ofensa; quando nos lembramos que a lei maior é sempre o amor.
Que o seu nome seja lembrado não apenas em manchetes de despedida, mas nas salas de aula onde se formam futuros magistrados, nos púlpitos onde se prega a dignidade, nos lares onde as crianças aprendem o que significa justiça.
E que os seus vídeos, espalhados pelo mundo como pequenas parábolas modernas, continuem a ensinar mais do que muitas bibliotecas de direito.
Rezemos, irmãos, pelo descanso do juiz Caprio.
Que encontre, no tribunal do Altíssimo, a mesma misericórdia que distribuiu na terra.
E que nós, tocados pela sua lembrança, possamos aprender a julgar menos e a compreender mais.
A justiça humana é breve; a justiça de Deus é infinita. Ele foi sinal dessa ponte entre as duas.
E como todos os sinais luminosos, não se apaga com a morte. Transforma-se em chama para os que ficam.




Como sempre leituras inspiradoras. Tive um problema no meu perfil antigo. Não consegui recuperar. Voltei a reler alguns texto. Obrigada.