A Mãe que Guardava o Sol
- Alberto Carvalho - Narrador

- 28 de jul.
- 2 min de leitura
A Mãe que Guardava o Sol
Dizem que havia, numa aldeia que já não vem nos mapas, uma mulher que sabia guardar o sol.
Era uma mãe como tantas outras: de mãos cansadas e olhos que pareciam ouvir.
Chamava-se Ana, e o filho, Tomás, tinha nascido num Outubro de chuva e vento, como quem vem ao mundo a pedir colo.
Desde pequeno que Tomás achava que a mãe era diferente.
Não diferente como quem brilha, mas como quem aquece.
Nunca gritava, mesmo quando o mundo parecia fazer-lhe barulho dentro.
Quando havia frio, ela cozia pão.
Quando havia medo, punha-lhe a mão na cabeça.
Quando a vida apertava, ela sorria — não para fingir, mas para ensinar.
Um dia, o rapaz perguntou-lhe: — Mãe, por que é que tu nunca te zangas?
Ela respondeu sem hesitar: — Porque cada vez que me apetecia gritar, guardei o sol dentro do peito.
Tomás cresceu com essa ideia.
Que a mãe era feita de silêncio e calor.
Que havia qualquer coisa dentro dela que a fazia maior do que os dias, mais firme do que os muros, mais paciente do que a noite.
Quando chegou à idade de partir, como todos os filhos partem, foi estudar para longe.
E às vezes esquecia-se de ligar.
Outras vezes lembrava-se e não sabia o que dizer.
Mas quando voltava, a mãe continuava ali: com o pão quente, a janela aberta, o mesmo riso manso de quem espera sem cobrança.
Um Inverno, ela adoeceu.
Não disse nada.
Continuou a varrer o quintal, a cozer as mesmas sopas.
Mas os olhos, esses, começaram a acender-se menos. Até que um dia, sem aviso, o sol faltou.
Tomás chegou tarde.
Já só encontrou a cama feita e o silêncio a cheirar a alecrim.
Mas sobre a mesa, havia um envelope com o seu nome.
Dentro, uma carta:
"Meu filho,"
"Não fiques triste. Guardei todo o sol que pude para que nunca tenhas frio. Ele está em ti agora. Quando fores bom sem razão, é meu. Quando te calares para ouvir, é meu. Quando amares sem ter nada a ganhar, sou eu a continuar." "Tu és o meu sol posto no mundo." "Com amor eterno," "Mamã."
Tomás fechou os olhos.
E nesse instante — mesmo nesse — o céu clareou.
Um raio atravessou a janela e pousou na cadeira onde ela costumava fiar.
E o filho soube, sem saber explicar, que a mãe ainda ali estava.
Não como presença, mas como lume.
Como promessa.
Como tudo o que aquece.
AC




Muito bom
Emocionante!
Saudações,