A Obra e o Poder
- O Caderno

- 5 de ago.
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Santidade de Gabinete: O Poder Silencioso da Obra
Há formas de poder que se anunciam com trombetas.
E há outras que se insinuam com silêncio.
O Opus Dei pertence a esta segunda categoria.
Não ergue bandeiras, não exige púlpitos, não clama por multidões.
Prefere os bastidores, os conselhos discretos, os lugares em que se decide mas não se vê.
É uma santidade que caminha de fato e gravata, uma espiritualidade com horários marcados e relatórios mensais, um fervor sem êxtase, mas com disciplina.
E essa combinação — fé interior com eficácia exterior — é precisamente a origem da sua força.
A influência do Opus Dei no espaço público raramente se mede em números.
Mede-se em nomes, em cargos, em redes.
Não são muitos, mas são estratégicos.
Advogados, magistrados, economistas, editores, reitores, consultores parlamentares.
Em muitos países, incluindo Portugal, há quem entre em certos corredores do poder e perceba, sem nunca o ouvirem dizer, que uma parte da sala fala a mesma língua espiritual — discreta, firme, blindada.
Não se trata aqui de conspiracionismo.
Quem conhece o Opus Dei por dentro sabe que a sua formação espiritual não tem nada de maquiavélico.
O que há é uma antropologia prática: o mundo será transformado não pelo protesto, mas pela presença; não pela denúncia, mas pela excelência; não pela ruptura, mas pela infiltração virtuosa.
E se for possível estar nas esferas onde se decide — políticas, jurídicas, culturais — melhor ainda.
Deus também habita nas actas das comissões.
Esta espiritualidade da influência não é nova.
Os jesuítas já a viveram, com o brilho dos colégios e o peso das consciências régias.
Mas havia nos jesuítas uma pedagogia aberta, um gosto pelo debate, uma entrega à missão universal.
No Opus Dei, a missão é mais seletiva: ganhar almas influentes, consolidar estruturas, formar líderes silenciosos.
O ideal não é a missão, é a eficácia.
A santidade é uma questão de aplicação.
É por isso que a integração de sacerdotes diocesanos na Sociedade Sacerdotal da Santa Cruz não é apenas uma questão eclesial ou teológica — é também um fenómeno de gestão espiritual do território.
A diocese tem o seu clero, o seu ritmo, os seus dramas.
A Obra introduz, entre esse corpo, uma elite espiritual paralela, mais formada, mais disciplinada, mais obediente — mas a outra autoridade.
E quando há nomeações, influências, promoções, quem terá mais apoio invisível?
O padre das lutas quotidianas ou aquele que recebe formação num centro da Obra, com acompanhamento semanal e direção espiritual meticulosa?
A resposta não está nos números.
Está no que nunca se diz.
Mais ainda: o Opus Dei representa, para muitos sectores da Igreja, uma última trincheira contra o caos contemporâneo.
Diante da crise do relativismo, da desinstitucionalização, da dissolução da moral tradicional, a Obra oferece um modelo que conforta: padres com batina e agenda, leigos piedosos e eficazes, famílias grandes e submissas à doutrina.
E isso, para muitos bispos, é mais fácil de acolher do que a inquietação dos pobres, a profecia das periferias ou o drama das vítimas.
A Obra não levanta questões — entrega resultados.
O problema é que, nesse processo, a espiritualidade transforma-se em ferramenta de gestão.
A santidade, em produtividade.
A fidelidade, em alavanca de poder.
E quem perde com isso?
Perde a Igreja.
Perde a liberdade espiritual.
Perde o povo de Deus, quando os seus pastores passam a responder a estruturas invisíveis.
E perde o próprio Evangelho, que nos ensinou a servir sem calcular e a amar sem garantias.
Há muito de admirável em muitos membros do Opus Dei.
Mas há algo de inquietante quando o amor à Igreja se manifesta como controlo.
Porque a Obra nasceu para santificar o mundo — e corre o risco de apenas o administrar.
AC




Mas nem todos são aceites no Opus Dei…
Há muito que queria saber.
Grata.
Grande, aprendi o que há muito queria.