Sábado Obrigatório
- Alberto Carvalho - Narrador

- 30 de jul.
- 2 min de leitura
A quem serve a imposição de trabalho ao fim de semana?
Não é só a pressa que desfigura a política.
É também a leveza com que se atropela aquilo que deveria ser sagrado: o tempo de um pai com os seus filhos.
Na mais recente proposta de alteração ao Código do Trabalho, o Governo pretende que os pais de crianças com menos de 12 anos passem a estar obrigados a trabalhar ao fim de semana, mesmo quando o seu pedido de horário flexível previa a exclusão dessa possibilidade.
A medida, travestida de modernidade laboral, não é mais do que uma reedição insidiosa da velha lógica da produção acima das pessoas.
O Supremo Tribunal de Justiça tinha fixado um entendimento claro: os horários flexíveis existem para proteger a vida familiar.
A decisão judicial reconhecia que um pai ou uma mãe não é apenas uma peça numa engrenagem — é um elo vital na estrutura emocional de uma criança.
Contrariar essa jurisprudência, como agora se propõe, não é apenas uma questão técnica.
É um recuo civilizacional.
Não se trata de negar que há sectores — saúde, transportes, distribuição — que exigem presença humana constante.
Trata-se, isso sim, de impedir que se torne regra o que deveria ser exceção.
E de reconhecer que mesmo nesses sectores, o direito à vida familiar deve ser protegido, negociado com humanidade, e não diluído em contratos de trabalho inflexíveis e impessoais.
É irónico que tudo isto surja num verão em que até o secretário de Estado admite que as negociações já se sobrepõem ao direito às férias.
Como se o tempo de descanso fosse um luxo.
Como se educar um filho ao domingo fosse uma frivolidade.
Como se o trabalho digno pudesse florescer à custa de infâncias amputadas de presença.
Querem tornar o trabalho ao fim de semana “habitual”.
E quando uma injustiça se torna habitual, passa a parecer natural.
Mas não é.
Obrigar um pai a virar as costas ao sábado de manhã com o filho, só para cumprir mais um turno num supermercado ou num call center, não é progresso.
É uma derrota invisível, repetida em milhares de lares.
Vivemos tempos em que as grandes causas parecem sempre adiadas.
Mas há pequenas resistências que dizem tudo.
Uma delas é esta: o direito ao fim de semana não é um capricho.
É uma trincheira onde se defende a infância, a intimidade e até a democracia.
Porque quando o Estado começa a legislar contra os afetos, o que se segue é sempre pior.
Que não se legisle com pressa nem com cinismo.
E que não se esqueça que, por detrás de cada horário imposto, há uma criança à espera.
AC




O que nos lutamos pelo fim do trabalho ao sábado e pelas 75 horas semanais. E conseguimos. As bibliotecas municipais passaram a fechar ao sábado e a redução do tempo de trabalho também . Querem tirar a quem trabalha os direitos adquiridos com tantas horas de luta e até de medo de quem estava contra . Portugal, para onde vais?