As coisas que os adultos esquecem
- Caderno das Duas
- 1 de nov.
- 2 min de leitura
Atualizado: 10 de nov.
Quando os adultos dizem que ser criança é fácil, apetece-nos rir. Não é má vontade — é que eles já se esqueceram. Esqueceram-se de como é ter vontade de mudar o mundo e não poder, de como é tentar explicar o que sentimos e não encontrar palavras que pareçam grandes o suficiente.
Às vezes, não é a infância que passa depressa — são os adultos que se esquecem de olhar para trás.
Ser criança é como estar sempre a meio de uma ponte: ainda não chegámos ao outro lado, mas também já não estamos no início.
Os adultos chamam-lhe “crescer”, como se fosse uma escada com degraus certos. Nós achamos que é mais uma corda bamba — às vezes andamos em frente, outras ficamos paradas a tentar equilibrar-nos.
Há dias em que tudo parece possível: mudar a escola, salvar o planeta, convencer os adultos a ouvir. Depois há outros em que tudo parece tão pesado que só apetece dormir. E mesmo assim, há sempre alguém a perguntar o que queremos ser “quando formos grandes”, como se o que somos agora não contasse.
Mas conta. Porque é agora que começamos a aprender a ver. A ver quando uma professora está cansada mas finge que não, quando um amigo faz piadas para esconder que está triste, quando um adulto diz “não tens idade para perceber” e o que quer mesmo dizer é “não tenho coragem de explicar”.
Nós reparamos nessas coisas. E é por isso que escrevemos: para não as deixar desaparecer.
Talvez um dia, quando formos adultas, também nos esqueçamos. Mas, se voltarmos a ler o que escrevemos hoje, talvez consigamos lembrar-nos de que o mundo era maior quando o víamos de baixo — e de que os sonhos cabiam melhor quando ainda não tínhamos medo de parecer tolas por tê-los.
